A PISTOLA KOLIBRI E O PAI DAS ARMAS DE FOGO EM MINIATURA

Fotografia cedida por colecionador do Estado de São Paulo. Imagem protegida por lei. Vedado sua reprodução.

É impossível se falar na Pistola Kolibri, mais conhecida como “Kolibri Pistol” sem contar um breve relato sobre a vida de Franz Pfannl, nascido em 15 de Outubro de 1866 em Stein an der Donau, Áustria.

Considerado o pai das armas em miniatura Franz Pfannl exercia a profissão de relojoeiro, tendo herdado o gosto pelas pequenas peças de seu pai Ferdinand Steiner Pfannl que também exercia essa profissão.

Já na década de 1890 encerrou sua atividade principal como relojoeiro e passou a concentrar-se na feitura de pequenas armas em miniatura como rifles Berloque em 2mm, algo em moda no final do século XIX. Foi nessa época que mentes profusas abriam caminho para o aparecimento de calibres pequenos como 25 ACP, 32 ACP dentre outros.

O inventor da Kolibri, antes de mais nada, era alguém a frente de seu tempo e um verdadeiro artista. Talvez a sociedade da época não reconhecesse esse trabalho, mas logo o tempo se encarregaria de expor sua incomparável obra prima: a Kolibri Pistol, conhecida como pistola beija-flor, cujo calibre de 2,7 milímetros seria o menor do mundo a ser disparado em uma pistola semiautomática até os dias atuais.

Já na década de 1890, Franz e seu amigo George Grabner aliaram-se para elaborar armas em miniatura destinadas à defesa de mulheres, que não queriam portar armas convencionais. Grabner possuía os meios econômicos de que Franz tanto necessitava para sua empreitada, já que seu amigo possuía uma fábrica de fundição em Krems. Tornaram-se parceiros econômicos nessa atividade.

Embora Grabner tenha prestado condições financeiras para a elaboração de muitas armas em miniatura, não teve ele qualquer participação na elaboração de projetos das pequenas peças, tampouco no design. A primeira patente de Pfannl data de 24 de julho de 1899.

Algumas dessas pistolas foram verdadeiras jóias, trabalhadas em ouro e prata. Muitas poderiam ser usadas como pingente. A grande maioria, mesmo sem adornos é considerada hoje como relíquia e expoentes de tecnologia cirúrgica para a época.

No início do Século XX, Franz Pfannl desenvolveu a pistola Kolibri, uma pistola semiautomática que dispararia um projétil de 2,7 milímetros de fogo central. Seria a menor munição de fogo central do mundo. Sua invenção foi patenteada em 1910 e produzida até o início da Primeira Guerra Mundial em 1914.

Muito embora Franz tenha produzido armas em miniatura antes e depois da invenção da pistola Kolibri, esta foi sua obra prima. O mais interessante fato é que as pistolas Kolibri foram produzidas com o intuito de servir como arma de defesa pessoal. Entretanto, seu cartucho minúsculo de incríveis 5,3 gramas seria considerado mais uma dissuasão do que efeito securitário. Segundo https://en.wikipedia.org/wiki/2mm_Kolibri:

“O cartucho pesa 5,3 gramas (82 grãos), mede 3 milímetros (0,12 pol.) No seu ponto mais largo e 11 mm (0,43 pol.) Da base do iniciador para a ponta da bala. O cartucho é encurralado na boca do gabinete. A bala em si mata 0,2 g (3 grãos), e estima-se que tenha uma velocidade normal do focinho de 200 metros por segundo (660 pés / s), resultando em uma energia de foca de 4.0J (3 ft-lbs).”

Essas pistolas foram produzidas de 1910 a 1914 e estima-se que sua produção não tenha chegado a 1000 unidades, o que as tornam extremamente colecionáveis. Embora tenha sido concebida para defesa pessoal  –  seu cartucho minúsculo e tamanho diminuto, prejudicavam o recarregamento (quando necessário). Ora! se já não é tarefa muito agradável municiar o pente de uma pistola normal, imagine municiar o pente da Kolibri. Portanto, tais pistolas eram adquiridas mais pela beleza de suas silhuetas e pelo excepcional trabalho de um homem acostumado a lidar com peças pequenas do que para o fim originariamente proposto.

Receber um disparo de Kolibri 2,7 mm seria muito menos doloroso e realmente muito menos perigoso do que receber disparos da grande maioria de “espingardinhas de pressão” fabricadas atualmente. Alias, muitas armas de pressão hoje causariam mais estrago do que o referido calibre.

Um ponto que merece destaque é o fato de que o interior do cano da Kolibri não possui raias. As estrias ou raias consistem nas ranhuras helicoidais no interior do cano, as quais permitem que o projétil percorra seu eixo em rotação para estabilizar o percurso a ser transcorrido pela bala, conferindo-lhe precisão entre a boca do cano e o alvo. Inexistia qualquer capacidade tecnológica, mesmo hoje diante de inúmeros aparatos, para imprimir raiamento em um cano tão pequeno. Assim, o disparo da Kolibri é impreciso a poucos metros e deveria ser usado para atirar a queima-roupa.

CURTA PRODUÇÃO

A produção de apenas 1000 pistolas entre os anos 1910 e 1914 pelo relojoeiro austríaco é icônica. No início da Primeira Guerra Mundial sua produção foi interrompida diante da brusca mudança no cenário econômico na região.

O que confere fama à pistola Kolibri não é apenas o diminuto tamanho de seu corpo ou calibre, mas sim o fato de que seu sistema é o mesmo utilizado em pistolas maiores (e modernas) como calibre 7,65 ou 32 ACP. Opera sob o mesmo processo de retrocesso simples da grande maioria das pistolas de fogo de hoje.

Também confere valor exacerbado como peça comercial entre colecionadores devido ao fato de que a grande maioria dessas pistolas foram capturadas como souvenir durante a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, muitas das quais perdidas ao longo do tempo, o que a torna item raro de coleção. Pesquisas mais aprofundada em sítios eletrônicos apontam para algo em torno de 200 pistolas kolibris 2,7mm existentes no mundo.

VERIFICAÇÃO DE OBSOLESCÊNCIA DA KOLIBRI PISTOL NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

A pistola Kolibri deve, necessariamente, ser considerada arma obsoleta, já que contém todos os atributos legais para essa conceituação, o que a torna peça de militaria que dispensa registro nos órgãos competentes como SINARM e SIGMA. 

CONCEITO DE OBSOLESCÊNCIA DA KOLIBRI

Para conceituar como obsoleta uma arma de fogo deve-se levar em consideração alguns critérios legais.

O fato da arma disparar pouco importa para verificação do critério de obsolescência. O que se deve verificar é se a munição utilizada pela arma não mais é fabricada comercialmente. A Kolibri, neste quesito, supera qualquer arma de fogo existente no mundo, já que mais raro deparar-se com a munição da Kolibri do que ela própria.

Na legislação anterior havia a exigência de que a arma, para ser considerada obsoleta, deveria possuir mais de 100 anos e ineficácia para o disparo, além de não possuir munição produzida comercialmente.

Com a revogação do Decreto n. 2.222/97, o conceito de obsolescência foi arrefecido e determinado como aquela “que não se presta mais ao uso normal, devido a sua munição e elementos de munição não serem mais fabricados, ou por ser ela própria de fabricação muito antiga ou de modelo muito antigo e fora de uso…”.

Portanto, temos que inexiste atualmente o conceito de arma obsoleta como outrora ventilado no Decreto n. 2.222/97, bastando que a arma seja muito antiga ou de modelo muito antigo e fora de uso e sua munição e elementos de munição não sejam fabricados, como é o caso da pistola Kolibri.

CURIOSIDADES

Embora minúsculo e extremamente fraco, ainda se deve ter cautela com a Kolibri. Ao disparar o minúsculo projétil de 3 grãos, devido seu peso muito baixo, lança-o a mais de 600 pés por segundo podendo ocasionar ferimentos severos nos olhos e regiões mais sensíveis. Entretanto seria incapaz de perfurar altas densidades de roupas, gordura e músculo até atingir um órgão vital.

A venda dessas pistolas não seguiu o controle de série e documentos exigidos para outras armas, o que dificulta até os dias de hoje saber quantas dessas pistolas foram compradas antes do início da Primeira Guerra Mundial. Estima-se apenas a feitura de menos de 1000 unidades.

Acontece que a Europa viveu duas grandes guerras, principalmente na região da Alemanha e Áustria, onde essas pistolas proliferavam. Tanto a Primeira Guerra quanto a Segunda proporcionaram a quase destruição dessas pistolas, já que elas tornaram-se souvenir de guerra entre os soldados que compunham os aliados, contribuindo para sua quase aniquilação. Pesquisas recentes em sítios eletrônicos apontam para uma taxa de pistolas Kolibri em torno de 200 unidades no mundo.

Após a Primeira Guerra Mundial Franz Pfannl projetou outras micro pistolas em calibres 3mm e 4,25mm, mas nenhumas delas se compararia à sua obra prima Pré-Primeira Guerra.

Atualmente as pistolas 2,7mm Kolibri são itens raros de coleção. Sua quase total destruição por meio de sucessivas apropriações durante a Primeira e Segunda Guerra Mundial elevaram consideravelmente seus preços. Hoje uma pistola Kolibri em estado razoável no mercado Norte Americano alcançaria facilmente cifras que girariam em torno de U$5.000,00 a U$7.000,00 dólares, mais de R$20.000,00 reais.

Mais raro que a própria arma seria encontrar munições dessa pistola (o que a torna arma obsoleta). Foram projetadas especificamente para uso na Kolibri, já que nenhuma outra arma do mundo as utilizaria. Com a interrupção de sua produção em 1914 a munição não mais foi fabricada comercialmente. Assim, as poucas pistolas kolibri, em sua grande maioria, não contém os minúsculos cartuchos, sendo raro colecionadores que possuem mais de 2 ou 3 cartuchos para ostentar em conjunto com a pistola. Abaixo, temos a imagem cedida por colecionador do Estado de São Paulo, onde se pode notar duas caixas originais da munição 2,7mm do início do século XX, uma verdadeira raridade no mundo dos colecionadores.

Mais rara do que a própria Kolibri são as munições. Acima, cortesia de colecionador do Estado de São Paulo, que além da pequena pistola possui duas caixas originais. Uma raridade!!!

Os colecionadores de armas de fogo dos EUA abrigam a maioria dos poucos remanescentes Kolibri 2,7mm. Franz Pfannl fabricou a Kolibri somente entre 1910 e 1914. Após o término da Primeira Guerra Mundial em 11 de novembro de 1918, passou a produzir outras armas em miniatura, inclusive pistolas quase idênticas à Kolibri. Entretanto, nenhuma dessas armas, como pequenos rifles berloque, garruchas, revólveres e pistolas angariariam valor colecionável como o da pequena Kolibri pré-guerra (WWI). Portanto, não se deve confundir o nível de raridade dos inúmeros outros modelos de mini armas confeccionadas por Pfannl, com a primordial Kolibri. Vejamos alguns modelos de armas de Pfannl menos valiosas no livro The Tiniest Guns de Bob Urso:

A pistola Kolibri até hoje segue sendo a menor pistola semiautomática de fogo circular do mundo.

No final do século XIX, portanto, antes da produção das pistolas Kolibri, Franz começou a produzir rifles 2mm de um único tiro. Embora essa arma disparasse o minúsculo calibre 2mm e fosse extremamente curiosa para a época, não poderia ser equiparado à tecnologia cirúrgica das pistolas Kolibri, que revolucionariam o conceito de arma em miniatura ao permitir o disparo semiautomático. Entretanto, foi na década de 1910 que produziu seu mais célebre trabalho.

Após a Primeira Guerra Mundial, Pfannl continuou a produzir armas em miniatura até meados de 1938, criando um projeto interessante de pequenas armas. Por isso é considerado o pai das pequenas armas de fogo.

 

A KOLIBRI NOS JOGOS DE RECREAÇÃO

O jogo eletrônico Battlefield 1, segundo preleciona o sítio eletrônico Wikipédia:

 

“…é um jogo eletrônico de tiro em primeira pessoa ambientado na Primeira Guerra Mundial, desenvolvido pela EA DICE e publicada pela Electronic Arts. É o décimo quarto jogo da franquia Battlefield. Foi lançado em outubro de 2016 para Microsoft Windows, PlayStation 4 e Xbox One. Foi um grande sucesso de crítica e vendas.”

 

Esse jogo procura retratar fielmente o cenário da Primeira Guerra Mundial, seja o ambiente das batalhas quanto das armas empregadas no conflito. Neste jogo podemos verificar a participação da pistola Kolibri ao lado de ícones da Primeira Guerra.

Esta é, claro, a menor arma do jogo, assim como a menos poderosa.

Verifica-se, portanto, que sua inclusão demonstra o fiel retrato dos projetistas do Battlefield 1, os quais conferiram a mesma dificuldade de lesão nos inimigos diante do uso dessa pistola, retratando de maneira mais real o conflito. É certo que, na vida real, essa pistola não foi utilizada na Primeira Guerra. Seu calibre seria incapaz de ferir com gravidade. Sua inclusão no jogo serve apenas para retratar com mais realidade o cenário das armas da época.

Percebe-se o diminuto tamanho da pistola ao ser manejada, exigindo que o operador efetuasse disparos utilizando apenas o dedo polegar e o indicador.

 

 

DEFESA OU DISSUASÃO

Ao que tudo indica a arma foi projetada para defesa pessoal de mulheres e pessoas que não queriam portar armas convencionais. Quando a Kolibri foi projetada era comum o uso de pequenos calibres, muito populares na Europa como o .32 e o .25 ACP.

Embora o calibre seja ineficaz para ferir com gravidade, a Kolibri poderia disparar 06 tiros em caráter semiautomático, servindo tanto de defesa quanto de dissuasão, afugentando o oponente.

Carregador com capacidade de 06 cartuchos 2,7 mm de fogo central.

Não poderia ser considerada como arma para defesa pessoal, muito embora esse conceito orientasse a finalidade de sua projeção. Como óbvio os disparos dessa pistola não poderiam ferir com gravidade, com exceção de lugares muito específicos como olhos, boca e pescoço. Ademais, para se disparar essa pistola, que sequer possui raiamento, o operador deveria efetuar o disparo utilizando apenas dois dedos (polegar e indicador) o que geralmente acarretaria, na maioria das vezes, errar o alvo.

Essas dificuldades no manejo da pistola ante de seu diminuto tamanho, mais tarde foram supridas por seu inventor que, após a Primeira Guerra Mundial criaria pistolas Kolibri em calibre 3 e 4mm. Entretanto, esses modelos em calibre um pouco maior não possuem o grau de busca colecionável alcançada pela verdadeira Kolibri em 2,7mm. Portanto, a pistola Kolibri de 2,7 mm era uma pistola de autodefesa e uma dissuasão ao mesmo tempo.

O fundador do site Armas Históricas é Advogado. Colecionador da 2ª RM. Estuda armas de fogo e artefatos militares e seu impacto e relevância para os dias atuais. Também é entusiasta e participa de encontro entre colecionadores do Brasil e exterior. Sócio da Confederação Brasileira de Tiro Esportivo no Estado do Rio de Janeiro.


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