Pistola CZ-27: um ícone da Segunda Guerra Mundial
Durante a ocupação da Tchecoslováquia pelos alemães na Segunda Guerra Mundial, as pistolas CZ-27 foram produzidas, em sua maior parte, sob o domínio nazista da aprisionada fábrica Ceská Zbrojovka, do que sob a soberania do governo Tcheco. Por isso, essa pistola merece destaque no ARMAS HISTÓRICAS.
O destino da Tchecoslováquia já estava selado quando foi assinado o Tratado de Munique datado de 29 de setembro de 1938 entre Hitler, Mussolini, Édouard Daladier e o primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain.
O tratado previa a anexação dos sudetos e o controle do país pelos alemães, desde que esta fosse a última reivindicação territorial da Alemanha ao se dizer extremamente prejudicada pelo Tratado de Versalhes no pós Primeira Guerra Mundial. Os líderes das potências mundiais da época fizeram essa enorme concessão aos alemães esperançosos de que este gesto acalmasse os planos militares do Führer.
Enquanto isso, a pistola CZ-27 estava sendo produzida pela Tchecoslováquia. Não chegou a ultrapassar o número de série 20.000 quando os alemães assumiram o controle total do país em março de 1939.
Após sua efetiva ocupação, os nazistas mudaram o nome da fábrica Ceská Zbrojovka para BÖHMISCHE WAFFENFABRIK e a pistola CZ-27 foi redirecionada para atender a finalidade do partido nazista de armar as polícias, a Wehrmacht e a Schutzstaffel (SS). Os números de pistolas nazistas da CZ-27 variam entre 20.000 e 475.000.
Trata-se de uma pistola semiautomática e seu desenvolvimento baseou-se no aperfeiçoamento de sua antecessora CZ-24.
A CZ-24 utilizava uma munição mais robusta: o 9mm short (9 x 17) e um sistema diferenciado de trava do ferrolho, chamado delayed blowback, que retardava a abertura da culatra após uma maior dispersão dos gases provenientes do disparo. Para simplificar seu sistema a CZ-27 diminuiu a potência de sua munição, passando a utilizar o calibre 7,65 Browning, também denominado de 0,32 ACP, abandonando o sistema delayed blowback e utilizando apenas o sistema blowback puro.
O calibre 7,65 é idêntico ao 0,32 ACP. A diferença reside simplesmente na origem do termo a ser empregado. A expressão que indica o calibre 7,65 é utilizada na Europa enquanto o calibre 32 ACP, em que pese designar a mesma munição é utilizado nos EUA. A sigla “ACP” significa “automatic colt pistol”.
Ao contrário da pistola Sauer 38-H da empresa JP Sauer & Sohn que após a Segunda Guerra Mundial teve sua produção interrompida e jamais voltou a ser produzida, a pistola CZ-27 continuou a ser produzida após o término da guerra em 1945. Foi produzida até a década de 1950. Por tal razão, somente as peças produzidas durante o conflito, sobretudo as do período de ocupação nazista, possuem maior valor entre os colecionadores.
A pistola CZ-27 possui capacidade de 8 disparos e utiliza o calibre 7,65 com mira fixa. O comprimento de seu cano é de 98mm e seu comprimento total é de 155mm, pesando 711 g. O total geral de pistolas CZ-27 fabricadas, incluindo as de uso comercial, as produzidas antes da ocupação alemã à Tchecoslováquia e as produzidas após o término da Segunda Guerra Mundial somam algo em torno de 650.000 unidades.
Sob a ocupação nazista de 1939 a 1945 foram produzidos na Tchecoslováquia surpreendentes 455.000 unidades da CZ-27 destinadas a atender os interesses da Alemanha nazista na Segunda Guerra Mundial.
O projeto de produção da CZ-27 da aprisionada fábrica de armas Tcheca manteve-se inalterado durante toda a ocupação nazista, evidentemente por seu projeto de desenvolvimento eficaz e extremamente rápido ante a simplicidade dos componentes gerais da arma, o que permitiria produção em massa dessa pequena pistola.
A CZ-27 NO CINEMA
O filme norte-americano de 1993 A lista de Schindler que retratou o empresário alemão Oskar Schindler trouxe a clássica cena da tentativa de execução de um judeu no pátio de uma fábrica ocupada por nazistas. A exposição e o uso da CZ-27 em uma das cenas cinematográficas mais clássicas da Segunda Guerra Mundial angariou fama à pequena pistola, elevando consideravelmente seu valor pela grande procura por colecionadores de armas de fogo em todo o mundo.
Este filme, considerado um clássico sobre o Holocausto e dirigido por Steven Spielberg, mostra a cena em que um judeu seria executado porque não produziu razoável número de dobradiças na fábrica situada no campo de concentração polonês. A cena revela que o homem seria, a princípio, executado por meio de uma pistola Luger P08.
Entretanto, para surpresa do Oficial nazista sua Luger não dispara. Embora faça o “click”, indicando que dispararia, o Oficial verifica o carregador e manobra a arma várias vezes, sendo que a arma ejeta os cartuchos mas não dispara após inúmeras tentativas. Ao que tudo indica pela conversação dos alemães a agulha ou fire pin da arma está enroscado. Após repetidas vezes tentando executar o homem o Oficial nazista saca a pistola CZ-27, exibindo-a.
Embora utilizasse um cartucho considerado fraco para emprego militar, a grande maioria dos países europeus adotavam o calibre 7,65 / 0.32 ACP como armamento padrão para defesa pessoal, emprego militar e policial.
A CZ-27 era arma comum dos agentes da Schutzstaffel, temida SS, que por sua vez dirigiam a totalidade dos campos de concentração espalhados pelos países ocupados pelos nazistas. Essa pistola é responsável por inúmeras execuções durante a Segunda Guerra Mundial, sobretudo em campos de concentração e foi bem retratada no cinema por Steven Spielberg. Essa icônica cena mostra o Oficial empunhando a CZ-27 e engatilhando-a para executar o judeu.
Ao que tudo indica o judeu foi salvo por milagre divino, pois o Oficial nazista se esqueceu de municiar a CZ-27, engatilhando-a e disparando-a diversas vezes contra o homem, onde não se vê a ejeção de cartuchos após cada engatilhamento, até se irritar e bater com a pistola na cabeça dele.
O Oficial nazista retratado no cinema foi interpretado pelo ator Ralph Fiennes no filme A lista de Schindler. O ator interpretou o monstro da Cracóvia. Amon Leopold Göth, nascido em 11 de dezembro de 1908, galgando posto de oficial SS-Hauptsturmführer e comandante do campo de concentração de Plaszów, na região da Cracóvia, na Polônia ocupada pelos nazistas. Foi responsável por milhares de execuções contra judeus, ciganos, homossexuais e prisioneiros políticos. Foi capturado pelos Aliados e executado em 13 de setembro de 1946. Sua sentença foi prolatada pelo Tribunal Supremo Nacional Polonês e foi enforcado no mesmo local onde cometeu os crimes de guerra.
Projeto e desenvolvimento da pistola
A pistola CZ-27 não possui o cano fixo à armação da pistola, podendo ser desmontado do seu conjunto. Entretanto, a pistola não movimenta o cano durante os disparos, pois se opera pelo sistema blowback, diferente de sua antecessora CZ-24, que utilizava o calibre 9 mm curto e sistema delayed blowback, que travava a culatra em movimento de giro do cano sob o próprio eixo, retardando a abertura da culatra.
A CZ-27 era uma pistola pequena e foi desenvolvida para simplificar e aperfeiçoar o sistema da CZ-24. Foi desenvolvida em 1926 por Frantisek Myska. Leva a designação “27” já que sua produção se iniciou em 1927.
Em todo o período de produção nazista, a pequena pistola levava a inscrição do waffenamt do lado direito: “águiaWaA76”, código este que indicava a origem, local de produção e calibre, designando, ainda, que a arma foi aceita para utilização militar pela Alemanha.
Do lado esquerdo da pistola temos a inscrição Pistole Modell 27 Kal. 7,65. O número de série vem estampado tanto do lado direito quanto do lado esquerdo da pistola. Na parte superior da pistola temos a inscrição BÖHMISCHE WAFFENFABRIK A. G. IN PRAG seguido do WaA76, e do número de série. Este modelo do início da produção nazista bem demonstra que o número de série é estampado em surpreendentes QUATRO lugares distintos na mesma arma (lado direito, esquerdo, acima e no cano).
Logo no início da ocupação nazista o nome da fábrica da CZ foi alterado para Fábrica de Armas da Boêmia: BÖHMISCHE WAFFENFABRIK A. G. IN PRAG. Neste exemplar do início da produção nazista vemos o nome da fabrica alterado, número de série 39883 (relativamente baixo já que a produção nazista iniciou-se acima de 20.000). O número de série está estampado em quatro diferentes lugares. Conta com apenas um Waffenamt “águiaWaA76” a direita da pistola.
O chamado “hammer” (martelo) da pistola é externo. A arma dispara somente em ação simples e a trava de segurança está localizada do lado esquerdo da pistola próximo ao gatilho.
Os sucessos das pistolas Tchecas devem especiais congratulações aos próprios alemães. Após o término da Primeira Guerra Mundial a Tchecoslováquia construiu um pólo bélico na cidade de Brno. Ali se instala a ZB: Zbrojovka Brno.
O governo Tcheco logrou adquirir algumas licenças da empresa alemã Mauser para a construção de armas na empresa Zbrojovka Brno. Além de adquirir maquinários da Mauser também obteve a ajuda de engenheiros militares alemães e projetistas de sucesso como o austríaco Josef Nickl.
Em 1923 a fábrica Zbrojovka Brno foi transferida para Strakonice e passou a denominar-se Ceská Zbrojovka ou simplesmente CZ, após os membros do serviço militar autro-húngaro tomarem o controle da fábrica em Brno.
Após o grande sucesso da CZ-24 do projetista Frantisek Myska, que aprimorara o projeto de Josef Nickl, surgiram os estudos da CZ-27. Assim, verifica-se que a evolução e a qualidade das pistolas Tchecas encontram grande suporte no estudo militar dos próprios alemães antes mesmo da eclosão da Segunda Guerra Mundial.
O modelo CZ 24 teve produção em torno de 190.000 exemplares, bem abaixo da exagerada produção de sua sucessora CZ-27. Vejamos a diferença entre a CZ 24 e a CZ 27. Na primeira, as ranhuras do ferrolho são levemente inclinadas, ao passo que, na segunda, as ranhuras são verticais.
As pistolas CZ ainda hoje são ícones de confiabilidade e amadas por atiradores desportistas em todo o mundo. Não seria diferente com as CZ-24 e 27. Eram extremamente confiáveis e de fácil manuseio. Derivam do estudo e ajuda militar da própria Mauser na Alemanha e, por conseguinte, possuem traços mecânicos das pistolas Mauser 1910 e 1914. Sem dúvida ícone de seu tempo e da própria engenharia militar alemã, já que os engenheiros e projetistas foram enviados pela Mauser à Tchecoslováquia.
Abaixo segue o Waffenamt da pistola CZ-27 (Marca de Inspeção Nazista), bem como o código “fnh“, destinado a substituir o nome da fábrica Böhmische Waffenfabrik a partir de 1944, na tentativa de dificultar aos aliados a identificação do lugar das fábricas ativas do III Reich.
Waffenamt Code | Manufacturer Code | Manufacturer (fábrica) | Série aproximada | Location | data |
WaA76 | não consta | Böhmische Waffenfabrik | 20.000 – 245.000 | Prag (CZ) | 1939-43 |
WaA76 | fnh | não consta | 245.000 – 475.000 | Prag (CZ) | 1943-45 |
As fábricas de armas da Tchecoslováquia não eram dotadas de grande potencial financeiro. O país estava se erguendo dos prejuízos econômicos ocasionados pela Primeira Guerra Mundial. Por tal razão a fábrica da CZ, em vários anos, produziu apenas 20.000 exemplares da pistola CZ-27 antes da ocupação nazista.
Em 1939 a fábrica foi rapidamente colocada à disposição dos interesses alemães e passou a produzir anualmente tantas pistolas que a soma anual era superior ao produzido pela fábrica da CZ de 1927 a 1938.
A produção nazista não alterou qualquer peça da pistola, mantendo todas as características originais, inclusive o calibre. Modificou apenas as inscrições e carimbos waffenamt nas peças, a começar pela alteração do nome da fábrica que passou a chamar-se Böhmische Waffenfabrik já no início da ocupação.
Ao final de 1943 e início de 1944 o departamento nazista de controle de armas criou o código “fnh”. Este código, embora utilizado somente no final da Segunda Guerra entre 1944 e 1945 foi criado para substituir na pistola o nome da fábrica Böhmische Waffenfabrik a fim de dificultar aos aliados identificar o local da produção da pistola CZ-27.
As primeiras 245.000 pistolas produzidas durante a ocupação da fábrica da CZ pelos alemães levavam o nome de rebatismo da empresa chamada pelos nazistas de Böhmische Waffenfabrik. É o caso da primeira pistola da fotografia esquerda. Nos demais há apenas a “águia” seguida do número de série.
Os nazistas produziram do número de série 20.000 ao número de série 245.000 pistolas que levavam o nome da fábrica Böhmische Waffenfabrik.
Acima do número de série 245.000, as pistolas que seriam utilizadas para uso militar da Wehrmacht e da SS, tiveram a inclusão do código de segurança nazista “fnh” aplicada pelo Hereswaffenamt. Na parte superior do ferrolho fora suprimido o nome da fábrica constando apenas a “águia” seguida do número de série.
A Agência alemã que controlava todas as armas da Wehrmacht e das organizações paramilitares do III Reich determinou no ano de 1943 a aplicação do código “FNH” para substituir imediatamente o nome da fábrica Böhmische Waffenfabrik, como forma de impedir futura localização de fábricas militares ativas pela Alemanha nazista.
Pistolas destinadas à polícia e agentes de segurança internos da Alemanha não receberam as pistolas com o código secreto de segurança, mantendo o nome da fábrica Böhmische Waffenfabrik.
Por fim, cabe enfatizar que as pistolas CZ-27 foram largamente utilizadas durante a Segunda Guerra Mundial e devem ser consideradas peças históricas que merecem um lugar de destaque dentre as armas colecionáveis. Foram produzidas pistolas CZ-27 até 1951. Entretanto, este artigo aborda somente as variantes e marcas de fabricação dos modelos produzidos durante a ocupação alemã à Tchecoslováquia, deixando de analisar os modelos produzidos antes e após o conflito.
Texto elaborado por ARMAS HISTÓRICAS, com a finalidade de identificar detalhes para o mundo do colecionismo. Não fazemos apologia ao crime ou nazismo. O texto tem finalidade de enriquecer o conhecimento dos colecionadores de armas do Brasil.
3 comentários
Marco Aurelio · 28/02/2017 às 16:17
Boa tarde excelente artigo. Estava buscando informações a respeito da CZ 27 e finalmente encontrei.
carlos · 28/02/2017 às 18:04
Boa tarde. Que bom ajudá-lo Marco. Conte sempre conosco em caso de dúvidas. O ARMAS HISTÓRICAS está em fase de construção. Todavia, esperamos em um futuro próximo abrigar maiores informações para a classe dos colecionadores e entusiastas da militaria. Atenciosamente Carlos.
Karla Soares · 02/03/2017 às 02:17
Boa noite Carlos. Sou professora e achei seu site muito interessante, com informações relevantes no contexto histórico. Aguardo novas publicações, parabéns!